INTRODUÇÃO

J. Peter Meekison

Em novembro de 2000, uma conferência com o tema “Instituições e Mecanismos para a Coordenação do Federalismo: Experiências Internacionais” foi realizada na Cidade do México. Esta pequena edição é uma extensão daquela conferência e alguns dos artigos aqui incluídos foram apresentados primeiramente no México. O Fórum das Federações foi o organizador e patrocinador da conferência.

Os organizadores dividiram a conferência em três sessões. A primeira sessão examinou as instituições formais e informais e os mecanismos de relações intergovernamentais. Nesta sessão houve ênfase especial nos mecanismos para a coordenação de atividades da principal repartição responsável pelas relações intergovernamentais com iniciativas intergovernamentais de outros departamentos de governo. A segunda sessão partiu da primeira e se concentrou em como evitar, gerenciar e solucionar conflitos entre o governo federal, unidades constituintes e seus representantes no legislativo federal. A sessão final foi dedicada a uma discussão sobre o plano de ação do México na área do federalismo, em particular as relações intergovernamentais. Os participantes internacionais foram explicitamente solicitados a dar conselhos aos mexicanos sobre como deveriam proceder.

Havia dois grupos de participantes da conferência. O primeiro consistia de representantes da equipe de transição do então presidente eleito Vicente Fox. Estes foram os indivíduos encarregados da tarefa de desenvolver uma série de recomendações para análise do presidente Fox quanto à mudanças que poderiam ser apropriadas à estrutura e aos processos de relações intergovernamentais no México. O segundo grupo consistia dos apresentadores dos artigos. Os apresentadores, de seis federações diferentes, eram todos indivíduos não eleitos, que tiveram experiências pessoais com os desafios das relações intergovernamentais diariamente.

O objetivo dos artigos e apresentações era dar aos mexicanos um amplo panorama das relações intergovernamentais e da solução de conflitos por várias perspectivas. As federações discutidas na conferência incluíam o Canadá, a Austrália, a Alemanha, os Estados Unidos, a Argentina e o Brasil. Este corte transversal de sistemas federais foi selecionado para dar à equipe de transição uma oportunidade de descobrir por si mesma a tremenda diferença entre as diferentes abordagens de relações intergovernamentais e a rica variedade de estruturas e processos associados com as relações intergovernamentais. Os participantes representavam tanto os sistemas parlamentares federais quanto os sistemas presidenciais de congresso. A maioria das apresentações foram feitas do ponto-de-vista das relações intergovernamentais vistas através das lentes de instituições do governo nacional, tanto executivo quanto legislativo. O representante australiano era o Diretor Geral do Gabinete Ministerial da Nova Gales do Sul, que falou do ponto-de-vista de uma unidade constituinte.

As apresentações da conferência de 2000 não foram documentos formais sobre o tema das relações intergovernamentais, nem eram longos tratados acadêmicos sobre a teoria das relações intergovernamentais. Em vez disso, forneciam uma descrição e uma análise das várias estruturas dos mecanismos e processos das relações intergovernamentais em vigor e alguns dos desafios que os indivíduos experimentaram pessoalmente. Com efeito, as apresentações eram dirigidas à profissionais da área. Todavia, elas geraram um volume considerável de diálogo e debate sobre

o assunto entre os mexicanos e os apresentadores, e entre os próprios apresentadores. Algumas partes da discussão esclareceram as informações enquanto outras se concentraram em estruturas específicas ou áreas problemáticas. A discussão na conferência foi tão entusiasmada que os organizadores da conferência decidiram publicar as apresentações para servir como um pequeno trabalho de referência para profissionais no campo das relações intergovernamentais. Dado a experiência mexicana com o federalismo ser recente, e para acrescentar ainda outras perspectivas para alguns dos desafios que o governo mexicano enfrenta nesta área, foram acrescentados à edição capítulos sobre a África do Sul e a Rússia, embora não tivessem sido apresentados na conferência original. Os artigos desta edição, excetuando-se Introdução, Conclusão, Rússia e África do Sul, estão colocados na ordem em que foram apresentados na conferência.

O objetivo da conferência foi o de ter todos os participantes concentrados em alguns dos assuntos práticos associados com as relações intergovernamentais em cada federação. Os participantes mexicanos abriram a conferência colocando duas questões gerais aos outros participantes. A primeira questão foi: “Como as relações intergovernamentais funcionam nos seis sistemas federais representados na conferência?” a segunda questão foi: “Baseado em suas experiências individuais, que conselho você daria ao México sobre qual deveria ser sua abordagem com a organização e os processos de relações intergovernamentais?”

Uma vez que estas questões foram colocadas, as apresentações e o decorrente debate concentraram-se nos seguintes tópicos. Que estruturas pertencentes às relações intergovernamentais existem em outras federações? Como e por que elas vieram a existir? O que elas fazem? Como estão organizadas? Qual o propósito delas? A quem elas se reportam? Quais são alguns dos problemas ou desafios que enfrentam os diferentes sistemas federais na esfera das relações intergovernamentais? Como são resolvidas as disputas intergovernamentais? Qual a diferença entre teoria e prática? Quais são alguns dos temas mais comuns ou recorrentes nas relações intergovernamentais? Como as relações intergovernamentais são coordenadas em nível nacional? Quais são algumas das dinâmicas políticas associadas com as relações intergovernamentais? Como são desenvolvidos as habilidades e o conhecimento dos servidores públicos? Como é garantida a autonomia do estado e dos governos locais? Como se poderia esperar, a lista de questões levantadas era grande e o tempo disponível para respondê-las curto demais.

O que de imediato ficou claro com o debate é que as relações intergovernamentais são uma característica comum de todas as federações. Esta realidade não deve ser nenhuma surpresa para quem quer que tenha estudado o federalismo. O que é interessante são as similaridades e diferenças na abordagem do assunto. Por exemplo, houve referências à vários dispositivos constitucionais tais como a divisão dos poderes e como o legislativo federal estava estruturado. Houve referências ao importante papel dos tribunais com respeito à interpretação constitucional e solução de disputas. Receberam atenção temas associados com o federalismo fiscal, tais como a equalização e o compartilhamento de receitas. Houve muitas referências ao papel dos governos locais. O que ficou muito evidente foi a importância do poder executivo no processo e nas práticas de relações intergovernamentais.

As diferenças ficaram especialmente evidentes ao examinar como cada federação aprendeu à lidar com as relações intergovernamentais. O papel dominante das Conferências dos Primeiros-Ministros no Canadá e na Austrália é um bom exemplo. Embora haja um equivalente alemão às CPM, suas atividades devem ser consideradas no contexto do papel central que o Bundesrat desempenha no sistema federal alemão. No caso dos Estados Unidos, Brasil e Argentina, a importância do presidente nas relações intergovernamentais era bastante evidente. Embora uma observação similar possa ser feita sobre os primeiros-ministros canadenses e australianos, o foco dos presidentes parece estar mais em seus congressos que em seus estados.

Minha função na conferência foi a de apresentar alguns comentários sobre a solução de disputas pela perspectiva dos canadenses. O balanço deste capítulo introdutório analisa esta questão.

No Canadá, a discussão e a análise das relações intergovernamentais são geralmente limitadas à relações federal-provincial e interprovincial. As dimensões federal-municipal e provincial-municipal, para a maioria, não costumam atrair o mesmo grau de análise no estudo do federalismo canadense como as perspectivas federal-provincial ou interprovincial. As províncias canadenses desencorajaram com veemência as relações federal-municipal e esta perspectiva não é objeto de meus comentários. Dito isto, deve-se notar que em muitas outras federações os governos locais recebem mais reconhecimento e peso na esfera geral das relações intergovernamentais.

Embora as relações intergovernamentais sejam um fato corriqueiro nas federações, a natureza destas relações varia consideravelmente e vão do harmônico ao tenso e hostil. Embora o termo “federalismo cooperativo” transmita uma imagem de tranqüilidade e harmonia, a realidade das relações intergovernamentais pode ser bem diferente. Quando as coisas funcionam, não lhes é dada a devida importância ou fazem parte do cenário. Quando surgem as disputas, elas têm um perfil muito público. Mesmo que com o tempo sejam resolvidas, elas tendem à ser lembradas e comentadas, às vezes por muitos anos.

Quais são algumas das fontes comuns de conflitos intergovernamentais? Eu identifiquei dez áreas que, na minha opinião, produziram a imensa maioria dos conflitos intergovernamentais dentro do sistema federal canadense. São elas:

  1. Disputas sobre jurisdição constitucional;

  2. Disputas sobre compartilhamento de receita ou a questão do desequilíbrio fiscal vertical;

  3. Disputas levantadas pelo desequilíbrio fiscal horizontal;

  4. Disputas sobre o poder federal de gastos;

  5. Disputas sobre as políticas de desenvolvimento regional e a questão de quais províncias se beneficiam mais com os gastos federais;

  6. Disputas sobre o controle dos recursos naturais;

  7. Disputas levantadas pelas diferenças culturais, lingüísticas ou religiosas;

  8. Ideologias conflitantes entre os partidos políticos;

  9. Confronto de personalidades;

  10. A falta de consulta intergovernamental e a decorrente ação unilateral por qualquer ordem de governo.

Obviamente, existem outras categorias, mas as dez listadas acima identificam a principal causa das maiores disputas intergovernamentais dentro do sistema federal canadense. Embora haja uma óbvia dimensão federal-provincial, essas dez fontes são igualmente aplicáveis às disputas interprovinciais, sendo um exemplo recente a crescente rixa, cada vez mais pública, entre aquelas províncias que receberam pagamentos de equalização do governo federal e as que não receberam. Como os artigos desta edição mostram, outras federações experimentaram disputas nestas áreas também. Como se poderia esperar, disputas sobre questões fiscais em suas várias manifestações se sobressaem e são recorrentes.

As disputas federal-provincial podem ser bilaterais, regionais ou multilaterais. As disputas também podem variar em intensidade, complexidade, importância, e na extensão do apoio ou oposição da província à uma posição em particular. Por exemplo, durante a disputa da patriação de 1980-81, duas províncias apoiaram a abordagem do governo federal e oito fizeram oposição à ela. Em 1990, quando o governo federal introduziu o Plano de Assistência Canadense, as províncias de Ontário, Columbia Britânica e Alberta se sentiram privadas de seus direitos. As disputas entre Quebec e o governo federal sobre a capacidade de Quebec para estabelecer o Plano de Pensão de Quebec ou sobre transferências federais para universidades são outros exemplos.

A natureza da disputa freqüentemente sugere o possível remédio. Este inclui evitamento, negociações intergovernamentais, ação do legislativo, enviar a questão aos tribunais ou emenda constitucional.

O evitamento é possivelmente a melhor abordagem. Infelizmente, é muitas vezes ignorado como estratégia. Por exemplo, se os governos percebem que a ação unilateral na esfera das relações intergovernamentais, como o exercício do poder federal de gastos, é propensa a precipitar uma reação adversa, a solução óbvia é a de evitar o confronto informando com antecedência e, se possível, estabelecendo algum tipo de consulta anterior. A maioria dos governos, como as pessoas, reage negativamente à surpresas desagradáveis, especialmente quando as surpresas estão incorporadas em parte de um orçamento e ocultas sob o manto do sigilo do orçamento.

Outra maneira de evitar disputas é se abster de xingamentos e insultos públicos gratuitos. É difícil solucionar disputas ou achar uma área de concordância se as pessoas não estiverem falando umas com as outras. Em resumo, o evitamento é uma questão de prevenção e de entendimento das causas de conflito e de tomar as medidas adequadas, se possível, para evitar que o conflito ocorra.

Outra maneira de evitamento, ou pelo menos de redução das disputas inclui encontros programados com regularidade entre ministros e funcionários para discutir questões de interesse mútuo. Talvez o melhor exemplo no Canadá seja os encontros do Ministro das Finanças com seus auxiliares. Esta interação se dá desde 1941, levando ao que Steven Dupré chama de “laços de confiança” entre os envolvidos no processo. Isto não significa que as questões negociadas tenham sido livres de conflitos, longe disto – mas o que significa é que aqueles envolvidos vêm à conhecer e confiar um no outro. Eles têm oportunidades contínuas de trocar pontosde-vista e procurar soluções viáveis. Um grande número de informações é trocado e aqueles envolvidos nos processos experimentam e enfrentam problemas comuns, quer seja a inflação, política tributária ou redução de déficit. As relações pessoais que se desenvolvem têm sido um importante fator na superação de muitas das irritações que surgem e que têm o potencial de se tornar um problema mais sério.

Recentes acordos intergovernamentais também podem ser considerados uma forma de evitamento de disputa. Um exemplo óbvio é o Acordo sobre Comércio Interno de 1995, que inclui, como parte do Acordo, uma seção sobre solução de disputas. Um segundo exemplo é o Acordo de Estrutura da União Social de 1999. Ele também incluía uma seção sobre solução e evitamento de disputas. Nenhum processo específico foi desenvolvido até agora, mas esforços para formular um mecanismo continuam como parte da revisão do Acordo. O que deve ser entendido é que os assuntos de ambos os acordos - barreiras comerciais interprovinciais e o exercício do poder federal de gastos – têm sido temas de litígio que há anos afetam as relações tanto federal-provincial quanto interprovincial. Os acordos representam uma solução negociada com a intenção de diminuir, se não de eliminar, tais disputas. Se as diferenças surgirem, o acordo prevê seus próprios processos de solução de disputas. A experiência no Canadá é tão recente que é muito cedo para se dizer com segurança se será ou não bem sucedida. A expectativa, no entanto, é que este tipo de acordo intergovernamental leve a uma redução significativa no número de disputas intergovernamentais.

Disputas inevitavelmente surgirão. Algumas são claramente casuais. Em outras instâncias é evidente desde o começo que o partido está bem ciente das ramificações intergovernamentais de suas ações. Tais disputas são freqüentemente resultado de ação unilateral, um comentário descuidado ou um plano de ação inesperado.

Quando grandes disputas intergovernamentais ocorrem, como os governos lidam com elas, no Canadá? Não existe um roteiro específico para os governos seguirem. Embora cada disputa seja diferente, existem alguns pontos em comum. O principal sendo a necessidade de diálogo intergovernamental e negociações. Na arena federal-provincial a primeira questão à ser considerada é a extensão em que todas as províncias serão afetadas e, caso sejam, a extensão do interesse delas no tema.

Por exemplo, no outono de 1980, depois que o governo federal demonstrou sua intenção de proceder unilateralmente com a patriação da constituição, as províncias organizaram uma reunião especial de primeiros ministros. Ficou claro, a partir daquela reunião, que as províncias não eram unânimes sobre uma resposta provincial. Algumas províncias se opuseram à ação do governo federal, algumas estavam indecisas e outras o apoiavam. O principal, aqui, é que as províncias consideraram uma resposta provincial unificada. A Conferência Anual dos Primeiros-Ministros serve como uma instituição importante para tratar de preocupações provinciais.

Com o tempo, as oito províncias discordantes concordaram com uma estratégia de duas partes. A primeira era desenvolver uma proposta alternativa àquela seguida pelo governo federal. A segunda era contestar a ação federal nos tribunais. A decisão de 1981 do Supremo Tribunal do Canadá abriu as portas para um entendimento negociado em uma Conferência de Primeiros-Ministros em novembro de 1981. O acordo final incluiu partes do plano alternativo das províncias. O resultado final foi A Lei de Constituição de 1982, que, entre outras coisas, incluiu a Carta de Direitos e uma fórmula de emenda.

O Programa Nacional de Energia (PNE) de 1980 apresenta um segundo exemplo onde as negociações intergovernamentais eram fundamentais para solucionar uma grande disputa. Neste caso, uma disputa bilateral entre os governos do Canadá e de Alberta. Embora o PNE também tenha afetado negativamente a província de Saskatchewan, os principais protagonistas eram Canadá e Alberta. O Governo do Canadá anunciou o PNE depois de uma série de reuniões inconcludentes sobre a renovação do acordo de preços de energia entre Canadá e Alberta. Alberta reagiu à iniciativa federal através de várias decisões de diretrizes, incluindo a redução da produção de petróleo bruto, a paralisação do desenvolvimento de areias betuminosas e o começo de uma contestação na Justiça sobre a constitucionalidade de um imposto federal proposto sobre exportação de gás natural. O objetivo implícito desta política de reação provincial era o de forçar o governo federal à voltar à mesa de negociações. Com o tempo, as negociações foram retomadas e chegou-se à um acordo sobre energia no outono de 1981, aproximadamente 10 meses depois que o PNE foi anunciado.

Existem algumas semelhanças óbvias entre as duas disputas descritas acima. Ambas ocorreram depois que negociações federais-provinciais anteriores se mostraram malsucedidas ou inconcludentes. Ambas resultaram de ação unilateral federal. Ambas levaram a uma resposta de diretrizes provinciais. A disputa da patriação envolvia uma intensa sessão de encontros interprovinciais seguidos de um encontro federal-provincial. Ambas incluíam casos de referência à cortes de recurso provinciais e finalmente uma decisão pelo Supremo Tribunal do Canadá. Ambas levaram ao reinício das negociações federais-provinciais e resultaram em um acordo negociado. Finalmente, ambas as disputas, embora resolvidas, deixaram sua marca nas relações federais-provinciais.

Tendo observado e participado nas negociações dos dois exemplos que dei, formei alguns pontos-de-vista sólidos sobre o que funciona melhor. Mesmo depois que uma grande disputa surge, minha visão continua sendo que um acordo negociado é o mais desejado e, se as experiências passadas servem de guia, o mais provável resultado. O que é necessário para obter este objetivo? Em primeiro lugar, é essencial que existam linhas abertas de comunicação entre os dois lados da disputa. Em segundo lugar, talvez seja necessário que os funcionários façam uma grande quantidade de trabalhos preparativos, identificando todos os assuntos que precisam ser tratados, terminologia à ser usada, dados necessários, concepções adotadas e os principais pontos de desavença, o que se pode chamar de “remoção do matagal.” Isto se mostrou muito eficaz nas negociações de energia quando os dois lados trabalhando juntos conduziram uma análise detalhada das diferentes concepções e conseqüências em que as duas posições diferentes estavam baseadas. Em terceiro lugar, deve ser feito um esforço para conter as expectativas de prováveis resultados e se abster de previsões sombrias. Finalmente, as partes da disputa devem determinar quando e em que estão preparadas para conceder e procurar soluções novas e inventivas. As partes também precisam reconhecer que o próprio fato de concordar em renovar as negociações sinaliza uma disposição em buscar algum tipo de acordo e uma aceitação tácita de que a solução da disputa é a alternativa preferida.

Nos dois exemplos dados acima, parte da estratégia global provincial era encaminhar certas questões aos tribunais para a opinião deles. Há um elemento de risco associado com qualquer decisão de envolver os tribunais em uma disputa federal-provincial, pelo simples fato de que os tribunais podem não dar a resposta desejada às questões perguntadas. O que é evidente é que os tribunais têm um papel importante e contínuo à desempenhar na solução de disputas intergovernamentais.

Em certas situações as relações intergovernamentais podem ou ser a abordagem errada, ou simplesmente, não ser um método eficaz de solucionar disputas. Exemplos óbvios são as situações onde o esclarecimento da jurisdição legislativa ou direito constitucional é essencial. Em tais circunstâncias, aos tribunais foram dados, ou estes assumiram, a responsabilidade de resolver a questão. O caso de referência da patriação é um exemplo, outro é o caso de referência do direito de Quebec de se separar do Canadá. Outros exemplos são os casos de referência sobre controle de direitos sobre minerais no mar territorial. Acham-se funções semelhantes desempenhadas pelos tribunais em outras federações, como vários autores demonstram. Em algumas situações, a necessidade de uma decisão do tribunal é clara ou inevitável. Menos claros são os casos onde recorrer aos tribunais é, na verdade, aceitar ou reconhecer o fracasso de diplomacia intergovernamental.

Finalmente, não se pode ignorar a legislação ou emendas constitucionais como meio de resolver ou evitar disputas. Por exemplo, em 1996, logo após o referendo de Quebec de 1995, o parlamento federal aprovou a Lei de Veto Regional que deu à Quebec, e às províncias de Ontário, Columbia Britânica e Alberta, um poder de veto à certas emendas constitucionais.

Outro exemplo foi o processo de revisão, de cinco anos, da Lei de Avaliação Ambiental Canadense. Em 1999, as províncias foram convidadas à fazer comentários e a sugerir emendas à Lei, como parte do processo de revisão. As discussões entre os ministros do meio ambiente federal e provinciais resultaram na aceitação pelo Governo do Canadá de algumas sugestões das províncias e rejeição de outras. A emenda constitucional é o método mais difícil de solucionar disputas e não foi uma alternativa particularmente eficaz no Canadá. Dito isso, a Seção 92A, que formou parte da Lei de Constituição de 1982, é uma exceção a esta observação geral. A emenda constitucional, que trata de jurisdição provincial sobre recursos naturais, reverteu duas decisões do Supremo Tribunal do Canadá que tinham afetado contrariamente as províncias.

A solução de disputas é um assunto de importância para todos os sistemas federais, como é demonstrado em muitos dos artigos. Embora os tribunais estejam sempre à disposição para ajudar nesta área, é de igual importância considerar meios de se evitar as disputas. Além disso, o uso de mediações e técnicas alternativas de solução de disputas para resolver algumas disputas apresenta novas e promissoras alternativas às relações intergovernamentais. O valor dos contínuos e freqüentes encontros intergovernamentais não deve ser desprezado. Numa análise final, as relações intergovernamentais eficazes dependem de fortes relações pessoais e confiança e respeito mútuos entre os indivíduos.