RELAÇÕES INTERGOVERNAMENTAIS

NA FEDERAÇÃO RUSSA

Por Alexei Avtonomov

Instituto de Estado e Lei (Academia Russa de Ciência)

CARACTERÍSTICAS GERAIS DA FEDERAÇÃO RUSSA

A Federação Russa é composta de 89 unidades constituintes, consistindo de: 21 repúblicas, 6 províncias, 49 regiões, 2 cidades federais, 1 região autônoma e 10 distritos autônomos. Teórica e historicamente, as Repúblicas, a região autônoma e os distritos autônomos são unidades constituintes definidas etnicamente, enquanto considera-se que as outras unidades são definidas territorialmente. Hoje, porém, as chamadas etnias dominantes só constituem maioria em 10 das 32 unidades baseadas etnicamente. Por outro lado, a porção de não-russos em algumas regiões é relativamente alta. Por exemplo, os tártaros compõem 17% da população na região de Ulianovsk, enquanto em várias das unidades definidas etnicamente a proporção da população que pertence ao grupo étnico identificado pelo nome da unidade constituinte é menos de 10%.

Não é difícil estabelecer que há uma necessidade para a coordenação intergovernamental na Federação Russa. A própria existência de um sistema federal é baseada na existência de diversidade regional. As diferenças culturais, econômicas, climáticas e ambientais entre as unidades territoriais da Federação Russa produzem grandes diferenças em prioridades de políticas, não só entre as próprias 89 unidades constituintes, mas também entre as unidades constituintes e a Federação. A Constituição Russa de 1993 provê a base constitucional para a interação intergovernamental. Como em tantas outras constituições federais, os dispositivos constitucionais nem sempre são suficientemente claros nesta área. Além disso, em muitas esferas de política pública há um grau considerável de jurisprudências sobrepostas.

A Constituição Russa de 1993 inclui características de federalismo simétrico e assimétrico. O Artigo 5 da Constituição é particularmente controverso. A Seção 1 do Artigo 5 estipula que todas as unidades constituintes são membros equivalentes da Federação Russa e a Seção 4 do mesmo artigo declara que todas as unidades da Federação serão iguais nas suas relações com órgãos administrativos federais. A Seção 2 do Artigo 5, porém, dispõe que só as Repúblicas podem ter constituições próprias. Todas as outras unidades constituintes poderão ter suas próprias cartas de direitos. Todas as unidades constituintes têm equivalente capacidade executiva e legislativa. A Seção 2 do Artigo 68 dá às Repúblicas o direito de estabelecer os próprios idiomas oficiais, além do russo.

DISTRIBUIÇÃO DE JURISDIÇÃO LEGISLATIVA

O Artigo 71 da Constituição concede jurisdição legislativa exclusiva à Federação Russa sobre:

O Artigo 72 da Constituição estabelece as seguintes áreas de jurisdição legislativa concomitante entre a Federação Russa e suas unidades constituintes:

  • medidas para assegurar a correspondência das constituições e leis das repúblicas e as cartas de direito e leis de outras unidades constituintes, bem como de outras regulamentações subnacionais e a Constituição da Federação Russa e leis federais;

  • direitos humanos e civis e proteção das liberdades; proteção dos direitos de minorias nacionais; ordem pública, segurança pública; regime de zonas fronteiriças;

  • questões de posse, utilização e administração de recursos do solo e do subsolo, água e outros recursos naturais;

  • divisão da propriedade do Estado entre os órgãos federais e subnacionais;

  • uso de recursos naturais; proteção ambiental e segurança ecológica; territórios naturais especialmente protegidos; proteção de monumentos históricos e culturais;

  • assuntos gerais de criação, educação, cultura científica, educação física e esporte da geração jovem;

  • coordenação de assuntos de assistência médica; proteção da família, da maternidade, da paternidade e da infância, proteção e seguro social;

  • tomada de medidas apropriadas no caso de catástrofes, desastres naturais, epidemias, e reparo dos estragos subseqüentes;

  • estabelecimento de princípios comuns de tributação e arrecadação na Federação Russa;

  • legislação administrativa, sobre procedimentos administrativos, trabalhistas, habitacional, sobre solo, água e florestas; legislação sobre recursos de subsolo e proteção ambiental;

  • corpo de funcionários de órgãos de justiça e órgãos de aplicação de lei; advogados e tabeliães;

    • proteção do habitat tradicional e do modo de vida tradicional de

    • minorias étnicas;
  • estabelecimento de princípios gerais de organização de órgãos governamentais, inclusive governos locais;

  • coordenação das relações econômicas internacionais e exteriores das unidades constituintes, cumprimento de acordos internacionais da Federação Russa.

Ajurisdição legislativa exclusiva das unidades constituintes encontra-se no Artigo 73. Suas jurisdições se estendem a todas as matérias não atribuídas exclusivamente à Federação Russa sob o Artigo 71 ou às áreas de competência concomitante encontradas no artigo 72. Como fica nítido após o exame dos Artigos 71 e 72, a jurisdição legislativa exclusiva das unidades constituintes é um tanto limitada.

Visivelmente, os dispositivos constitucionais que tratam da distribuição de jurisdição legislativa entre a Federação Russa e suas unidades constituintes são obscuros, em muitos casos, e como resultado são controversos. Por exemplo, os direitos humanos e civis e a proteção das liberdades, como também a proteção dos direitos das minorias nacionais estão incluídos como jurisdição exclusiva da Federação Russa, e concomitantemente como jurisdição da Federação Russa e suas unidades constituintes. Como esta contradição pode ser solucionada? Ninguém sabe!

Um dos problemas mais graves, que ainda não foi resolvido desde a adoção da Constituição de 1993, é como a Federação Russa e as unidades constituintes devem compartilhar responsabilidades dentro da área de jurisdição em comum. O Artigo 76 da Constituição dá algumas diretrizes com respeito à superioridade federal. Como resultado dos freqüentes impasses políticos a nível federal, muitas unidades constituintes agiram unilateralmente em áreas de jurisdição em comum. Por conseguinte, suas legislações freqüentemente contradizem a Constituição ou leis federais adotadas subseqüentemente. É por isso que o aspecto mais controverso desta divisão de poderes é a natureza ambígua do conceito de competência concomitante. A própria Constituição não é clara sobre como o governo federal e as unidades constituintes devem coordenar suas atividades legislativas, particularmente na ausência de legislação federal. No entanto, a Constituição dispõe que os poderes dentro da jurisdição em comum da Federação Russa e suas unidades constituintes devam ser compartilhados por uma lei federal ou por um tratado entre órgãos administrativos federais e órgãos administrativos das unidades constituintes.

Há vários desses tratados e acordos que fortalecem o caráter assimétrico da estrutura federal. O tratado com Tatarstan, assinado em 15 de fevereiro de 1994, representou o primeiro passo significativo para esta federação assimétrica. Desde 1994, 46 unidades constituintes individuais assinaram tratados bilaterais especiais com o governo federal. Tais tratados estão rapidamente substituindo os dispositivos de divisão de poderes da Constituição como a base principal das relações intergovernamentais. Estes acordos bilaterais freqüentemente dão para a unidade constituinte mais direitos significativos sobre a disposição de recursos naturais no seu território, concessões tributárias especiais e outros privilégios econômicos e políticos. Em muitos casos, tais tratados foram assinados às vésperas de eleições parlamentares e presidenciais, o que poderia ser visto como parte de um pacote para encorajar as unidades constituintes a apoiarem o presidente russo.

Em Tatarstan e em Bashkortostan, ricos em energia, os acordos bilaterais levaram indústrias lucrativas tais como a de extração de petróleo, refinarias e usinas de geração de energia a saírem da jurisdição central e serem entregues ao controle e propriedade local. Em junho de 1995, Sakha assinou um tratado com a Federação Russa, que deu à República a propriedade de 26% de sua produção de diamantes, 30% de sua produção de ouro e uma porcentagem ligeiramente menor de suas reservas de óleo e gás. De acordo com alguns especialistas russos, como resultado de transações orçamentárias especiais com as Repúblicas de Karelia, Tatarstan, Bashkortostan e Sakha, as autoridades federais tiveram perdas imediatas na arrecadação tributária em 1994 (e, presumivelmente, em 1995) de pelo menos 2 trilhões de rublos, ou 2,3% das receitas do orçamento federal para 1994.

Entre os privilégios não-econômicos adquiridos assimetricamente, pode-se encontrar transferências de jurisdição federal exclusiva à jurisdição republicana nos tratados entre a Federação Russa e Tatarstan e Bashkortostan. A constitucionalidade de tais transferências é questionável.

Por outro lado, o governo federal intervém em alguns tratados na jurisdição exclusiva de certas unidades constituintes. Por exemplo, o tratado com a região de Sverdlovsk estipula que um Tribunal de Carta de Direitos (analogia para Constitucional) regional poderia ser criado lá. Mas uma região não precisa de permissão especial de órgãos federais para criar esta ou aquela instituição governamental, porque a Constituição Russa de 1993 dispõe que o poder de estado nas unidades constituintes é exercido por órgãos governamentais, formados pelas próprias unidades constituintes.

Praticamente todos os tratados foram complementados com uma série de acordos bilaterais que lidam com certas seções da administração. No total, mais de 200 acordos bilaterais foram assinados juntamente com os tratados. Estes acordos foram assinados entre ministérios ou departamentos das unidades constituintes e ministérios federais individuais. Apenas um exemplo, entre muitos, o Ministério de Combustível e Energia assinou 26 desses acordos até 1996.

Embora o status legal-constitucional destes tratados ainda seja obscuro, na maioria dos casos eles proporcionam para as unidades constituintes em questão mais autonomia em relação ao governo federal e às unidades que não assinaram tratados bilaterais. Embora a Constituição permita um pouco de flexibilidade nas relações entre o centro e a periferia (ver Artigo 78), há o perigo de que tais tratados possam minar seriamente a autoridade da Constituição. Os tratados também transformam em piada o Artigo 5 da Constituição, que declara que as relações entre o centro e todos os sujeitos da federação são equivalentes. Além disso, está claro que os tratados bilaterais têm, em todos os aspectos a não ser no nome, elevado um seleto número de regiões ao status de Repúblicas de facto. O presidente russo anterior, Bóris Yeltsin, tinha adotado claramente tal política para as regiões como parte de uma estratégia de dividir-econtrolar, mas há dúvidas de por quanto tempo esta política pode ser sustentada. É sabido que uma federação baseada em tratados é uma federação fraca, que acabará por fim se destruindo.

Desde 1999, o processo de elaborar e assinar novos tratados entre a Federação Russa e as unidades componentes esteve paralisado. O Presidente Vladimir Putin, depois de sua eleição para a presidência, decidiu reconsiderar a prática prévia de dividir poderes dentro da jurisdição comum da Federação Russa e suas unidades constituintes. Assim, no dia 29 de junho de 2001, foi estabelecida por decreto presidencial uma nova Comissão para a divisão de competências e poderes entre a Federação Russa e as unidades constituintes. Dmitri Kozak, deputado chefe da Administração Presidencial foi designado como Presidente da Comissão. De acordo com o decreto, a Comissão deve preparar propostas relativas à divisão de poderes entre a Federação Russa e as unidades constituintes até 1o de junho de 2002. A Comissão é composta de vários ministros federais, servidores públicos de alto escalão de ministérios federais, chefes de órgãos executivos de algumas unidades constituintes (inclusive Mentimir Shaimiyev, o Presidente de Tatarstan), e certos especialistas. O decreto requer a criação de comissões regionais em cada um dos sete distritos federais sob a supervisão do representante plenipotenciário do presidente russo. As comissões regionais tiveram até 15 de dezembro de 2001 para apresentar à Comissão as suas visões sobre as propostas de divisão de poderes.

Tem surgido na Rússia uma discussão sobre a divisão de poderes entre a Federação Russa e suas unidades constituintes. Muitos políticos e acadêmicos consideram que a própria existência de jurisdição em comum é a razão para a assimetria dentro da Federação e as ambigüidades legais e organizacionais associadas com as relações entre a Federação Russa e as unidades constituintes. Não é uma regra, porém, que onde a jurisdição esteja claramente definida e resolvida haverá menos contato intergovernamental. Nenhuma federação pode evitar situações onde certas áreas de políticas envolvam o governo federal e suas unidades constituintes, ainda que a constituição da federação não diga nada sobre jurisdição em comum (o exemplo mais eloqüente é o dos Estados Unidos). Interdependência e jurisprudências sobrepostas são componentes corriqueiros em sistemas federais.

Como resultado disto, o problema não consiste em como se evitar jurisdição comum entre a Federação Russa e suas unidades constituintes, mas em como definir e esclarecer as esferas de envolvimento da Federação Russa e suas unidades constituintes dentro das áreas de políticas de jurisdição em comum. O problema também inclui como organizar a cooperação entre a Federação Russa e os órgãos administrativos das unidades constituintes no cumprimento de suas responsabilidades.

A ESTRUTURA DA COORDENAÇÃO INTERGOVERNAMENTAL

A Constituição delineia vários mecanismos específicos para solucionar disputas entre o governo federal e as unidades constituintes ou entre as unidades constituintes. O Artigo 85 estabelece que o Presidente pode usar procedimentos reconciliatórios para resolver tais disputas. Se não houver acordo, o Presidente pode enviar o caso ao tribunal apropriado. Por exemplo, o Tribunal Constitucional foi envolvido na resolução de vários casos de conflito jurisdicional. As decisões do Tribunal Constitucional estão gradualmente preenchendo as lacunas na Constituição, bem como esclarecendo certos dispositivos constitucionais.

De acordo com o Artigo 15 da Constituição, não é permitido à legislação de uma unidade constituinte infringir a constituição federal. Embora tal dispositivo exista, um dos assuntos mais contenciosos do período póssoviético tem sido a “guerra de leis” entre o governo federal e as unidades constituintes. Em 2000, o Ministério de Justiça revelou que mais de 50.000 atos legislativos regionais não estão de acordo com a Constituição Federal ou as leis federais. Podem ser encontrados diferentes números nesta situação, divulgadas pelo Ministério de Justiça, o Promotor Geral, o Principal Departamento Jurídico do Presidente. Por exemplo, o Promotor Geral anunciou em 1998 que, no período de 1996-1997, os promotores em todos os níveis contestaram cerca de 2.000 resoluções e leis aprovadas por parlamentos regionais, por terem violado a Constituição Federal de certa forma. Embora estas sejam as visões de instituições nacionais diferentes, deve-se notar que somente as cortes federais têm o direito de decidir sobre a inconsistência ou conflito das leis de unidades constituintes e outras ações com leis federais. Além disso, somente o Tribunal Constitucional tem o direito de determinar a inconsistência das constituições (Cartas de Direitos) e leis das unidades constituintes com a Constituição Russa.

O Presidente também tem o poder de suspender atos executivos das unidades constituintes, se eles contradizem a constituição federal, leis federais, obrigações internacionais da Federação Russa ou constituem uma brecha nos direitos humanos ou civis e nas liberdades.

Há certos órgãos federais dentro dos quais as unidades constituintes são representadas. Tal representação permite às unidades constituintes tomar parte no processo de tomada de decisão no nível federal. Um dos mais importantes entre eles é o Conselho da Federação, uma das duas Câmaras da Assembléia Federal. O Conselho da Federação tem a competência para:

  • aprovar mudanças de limites administrativos entre unidades constituintes da Federação Russa;

  • aprovar decreto do presidente russo sobre a introdução de lei marcial;

  • aprovar decreto do presidente russo sobre a introdução de um estado de emergência;

  • decidir sobre a possibilidade de usar as Forças Armadas Russas fora do território da Federação Russa;

  • convocar uma eleição presidencial;

  • impugnar o Presidente da Federação Russa;

  • designar os juízes do Tribunal Constitucional, do Supremo Tribunal e do Tribunal Superior de Arbitragem da Federação Russa por uma proposta de candidatos pelo Presidente;

  • designar e afastar o Promotor Geral por uma proposta pelo Presidente;

  • designar e afastar o vice-presidente e metade dos auditores da Câmara de Contas.

O Conselho da Federação não pode criar emendas a uma legislação aprovada pela Duma do Estado, podendo apenas aceitar ou rejeitar a legislação. Se ela não considerar um projeto de lei dentro de 14 dias após seu recebimento, a legislação é considerada como aprovada pela Duma do Estado. É importante notar que o Conselho da Federação normalmente se reúne para uma única sessão de 2 a 3 dias a cada mês. Como conseqüência,

o Conselho da Federação não tem nenhuma possibilidade real de considerar todas as leis federais propostas em grande profundidade. A Constituição exige que o Conselho da Federação examine certas matérias e decida sobre os seguintes assuntos:

• o orçamento federal;

  • arrecadação e impostos federais;

  • regulamentação financeira, monetária, de crédito e aduaneira; emissão de dinheiro;

    • ratificação e denúncia de tratados internacionais da Federação

    • Russa; •o status e a proteção da fronteira da Federação Russa;
  • guerra e paz.

O Conselho da Federação desempenha um papel especial nas relações intergovernamentais, devido à sua composição. Cada uma das 89 unidades constituintes tem dois representantes no Conselho da Federação. A Constituição dispõe que, destas duas cadeiras, uma seja reservada para

o poder executivo da unidade constituinte, a outra para o poder legislativo da unidade constituinte. A maneira de sua seleção é determinada através de lei federal. Em 1993, o povo votou diretamente para seus dois deputados (e muitos chefes dos poderes executivo e legislativo das unidades constituintes foram eleitos). Em 1995, os membros do Conselho da Federação foram selecionados em uma base ex officio dentre os chefes dos poderes executivo e legislativo dos governos das unidades constituintes. Em 2000, o Presidente Putin iniciou reformas adicionais no processo de seleção. De acordo com uma lei federal promulgada em 2000, os órgãos executivo e legislativo da unidade constituinte nomeiam, cada um, um membro do Conselho da Federação. Uma substituição gradual dos chefes dos poderes executivo e legislativo por seus indicados no Conselho da Federação aconteceu na última metade de 2000 e ao longo de 2001. Em janeiro de 2002, o Conselho da Federação deve começar seu trabalho consistindo completamente de deputados nomeados pelo novo processo de seleção. É esperado que este arranjo faça o Conselho da Federação mais eficiente ao mesmo tempo em que mantenha a cooperação intergovernamental em um alto nível. A composição do Conselho da Federação (inicialmente, de chefes dos poderes legislativo e executivo das unidades constituintes e, a partir de 2000, de indicados destes poderes) dá a seus membros acesso direto ao processo de tomada de decisão federal para unidades constituintes individuais. Como resultado, o Conselho da Federação serve como uma abrangente e significativa instituição para a cooperação intergovernamental.

Alguns especialistas e políticos expressaram um certo grau de ansiedade depois da adoção do novo processo de seleção para membros do Conselho da Federação. Eles acham que a ausência de governadores e presidentes das unidades constituintes de Moscou pode estragar a maquinaria da coordenação e cooperação intergovernamental. No entanto, o presidente Putin também montou um órgão consultivo - o Conselho de Estado - no outono de 2000. Este órgão consiste de todos os chefes do poder executivo das unidades constituintes. O Conselho de Estado se encontra trimestralmente a pedido do Presidente russo para discutir questões específicas. Uma superintendência foi criada dentro do Conselho de Estado. A superintendência se reúne mensalmente e consiste de sete membros tirados do Conselho de Estado em um sistema de rodízio. Estas reuniões dão aos chefes das unidades constituintes uma oportunidade para expressar suas opiniões em grandes iniciativas empreendidas pelo governo federal.

Além disso, já foram criados alguns grupos de trabalho improvisados dentro do Conselho de Estado para preparar propostas para reformas nas esferas econômica e política. Por exemplo: grupos de trabalho para assuntos como federalismo, produção e distribuição de energia, desenvolvimento dos governos locais, e a melhoria de administração federal estão funcionando. A composição dos grupos de trabalho do Conselho de Estado não foi limitada a membros do Conselho de Estado. Os grupos incluem 2 ou 3 representantes do Conselho de Estado mais deputados da Duma do Estado e dos legislativos das unidades constituintes, funcionários de alto escalão dos respectivos ministérios federais e da Administração Presidencial, além de especialistas altamente qualificados.

Os representantes presidenciais plenipotenciários que o Presidente Putin nomeou, depois de dividir o país em sete distritos federais, em maio de 2000, também estão envolvidos com a cooperação e a coordenação intergovernamental. Espera-se destes representantes que fiscalizem a implementação de políticas federais no nível regional e local e coordenem seções locais de órgãos executivos federais. Assim sendo, os representantes presidenciais não podem se furtar a cooperar com os órgãos administrativos das unidades constituintes ao tratar de assuntos dentro da jurisdição em comum. Os representantes presidenciais e o seu staff reúnem-se regularmente com os funcionários das unidades constituintes, organizando coordenação bilateral e multilateral de esforços. Alguns representantes presidenciais montaram órgãos consultivos e grupos de trabalho improvisados, convidando funcionários locais e acadêmicos para servirem como membros. Todos os representantes presidenciais mostraram que suas prioridades incluem, entre outras coisas, projetos de desenvolvimento social e econômico, captação de investimentos e luta contra crimes econômicos. Está claro que avanços positivos nestes campos somente são possíveis no caso de esforços em conjunto de órgãos federais e de unidades constituintes. Os representantes presidenciais também são ativos nos processos de assegurar que as constituições (Cartas de Direitos) e leis das unidades constituintes sejam consistentes com a Constituição e leis federais.

Muitas unidades constituintes têm gabinetes em Moscou. As Repúblicas dentro da Federação Russa mantiveram seus gabinetes estabelecidos durante a era soviética. Outras unidades constituintes abriram seus gabinetes no período pós-soviético. Ainda que as atividades destes gabinetes não chamem muita atenção pública, eles são realmente importantes para a assistência técnica e operacional cotidiana das relações intergovernamentais.

Tem havido uma recente tendência para fortalecer o poder de autoridades centrais. Por exemplo, em 1999, foram adotadas emendas para a lei federal sobre os princípios gerais da organização dos órgãos legislativos e executivos das unidades constituintes. Estes novos dispositivos legais permitem ao presidente russo afastar o chefe do poder executivo das unidades constituintes ou dissolver o legislativo de uma unidade constituinte. Tal exercício da autoridade presidencial pode ocorrer em situações onde um tribunal determinar ter havido uma violação da Constituição Federal ou de uma lei federal pelo chefe do poder executivo ou de um legislativo, respectivamente, e nenhuma ação tenha sido impetrada para sanar a situação.

Em 2001, a lei federal para a milícia (a polícia) ganhou uma emenda. De acordo com a nova versão da lei federal, os chefes dos departamentos de assuntos internos das unidades constituintes serão nomeados pelo ministro federal. Anteriormente, eles eram nomeados pelo ministro federal com o consentimento do chefe do poder executivo da unidade constituinte. A prática mostrou que, em alguns casos, este método de seleção dos chefes dos departamentos de assuntos internos das unidades constituintes levou o departamento a um impasse, o que deu mais oportunidades a criminosos.

AS RELAÇÕES INTERGOVERNAMENTAIS NA ESFERA ORÇAMENTÁRIA

Neste momento, conforme os Códigos Orçamentários e Tributários federais, a cota das receitas de imposto das unidades constituintes deveria ser de aproximadamente 50% das receitas totais. Esta regra foi violada em 2000. (O imposto sobre valor agregado (IVA), o imposto sobre o lucro das empresas e os impostos sobre produtos comercializados são compartilhados entre o governo federal e as unidades constituintes, enquanto o imposto de renda pessoal é completamente determinado às unidades constituintes). O governo federal preparou um projeto de orçamento para 2001 que sugeria que as receitas tributárias deveriam ser compartilhadas da seguinte forma: 70% para o orçamento federal e apenas 30% para os orçamentos de unidades constituintes. Depois de uma longa batalha na Assembléia Federal, o orçamento de 2001 foi adotado. Foram alocadas 65% das receitas tributárias para o orçamento federal e 35% para os orçamentos das unidades constituintes. As unidades constituintes consentiram nesta divisão de renda, compreendendo que o governo federal arcaria com as dívidas externas. No futuro, o governo federal poderá tentar modificar novamente as cotas prescritas de receitas tributárias delineadas nos Códigos.

Das 89 unidades constituintes que compõem a Federação Russa, menos de 10 remetem mais receitas ao orçamento federal do que recebem em subsídios. Algumas unidades constituintes são quase completamente dependentes dos subsídios federais. A distribuição de financiamento público nem sempre esteve baseada na necessidade econômica. Na verdade, os pagamentos de transferências federais foram usados freqüentemente como meio de comprar os líderes de unidades constituintes que são críticos ao governo. É claro que tal tática só funciona à curto prazo. Elas encorajam o obstrucionismo por parte das unidades constituintes enquanto simultaneamente aumentam as disparidades econômicas pelo país.

OS VÍNCULOS INTERGOVERNAMENTAIS HORIZONTAIS

Até aqui, somente as relações da federação com as unidades constituintes foram consideradas. Tais relações são, claro, muito importantes. De igual importância são as formas de cooperação estabelecidas entre as unidades constituintes, sem um envolvimento direto das autoridades federais. Por exemplo, foram fundadas oito associações para cooperação econômica na primeira metade dos anos 90. Estas associações foram identificadas geograficamente (o Oriente Distante, o Acordo siberiano, o Grande Volga, etc.) e foram criadas por iniciativa das unidades constituintes. Embora não haja nenhuma proibição contra as unidades constituintes participarem em mais de uma associação, quase todas as unidades constituintes uniram-se a apenas uma associação. Além disso, a composição destas associações é estável. Durante todo o período de suas existências, só um número limitado de unidades constituintes mudou de uma associação para outra. As associações foram estabelecidas com a finalidade do desenvolvimento econômico e da cooperação mutuamente benéfica, e cada uma delas é composta por diferentes tipos de unidades constituintes (Repúblicas, regiões, províncias, distritos autônomos, etc.).

A importância destas associações cresceu na segunda metade dos anos 90, e em 1998, o Primeiro-ministro Yevgeni Primakov chegou até mesmo a convidar líderes eleitos (um dos chefes do poder executivo das unidades constituintes) de todas as oito associações para compor o gabinete. Depois, a situação mudou. Uma lei federal de 1999 sobre associações de cooperação econômica era vaga e não continha mecanismos e incentivos legais para um maior desenvolvimento desta forma de cooperação interregional. A criação de sete distritos federais em maio de 2000 trouxe ainda mais confusão, porque os limites dos distritos federais coincidiram apenas parcialmente com os limites das oito associações econômicas. Ao mesmo tempo, alguns representantes presidenciais expressaram a sua prontidão para cooperar com as respectivas associações e estabeleceram ligações com as lideranças das associações.

Também há diferentes e múltiplos contatos multilaterais e bilaterais improvisados entre as unidades constituintes. Há certos casos em que uma unidade constituinte engloba outras unidades constituintes, e elas formalizam os contatos entre si por meio de tratados e acordos. Por exemplo, a região de Tyumen inclui dentro de seu limite administrativo os distritos autônomos de Yamalo-Nenets e Khanty-Mansi, embora as três unidades constituintes sejam consideradas iguais em status e tenham relações diretas com o governo federal. Tal situação é um legado histórico do período soviético, quando todos os distritos autônomos eram parte de certas regiões e províncias. Naquele tempo, havia uma rígida hierarquia entre as unidades constituintes. Para que as relações entre eles fossem claras e regulamentadas, a região de Tyumen e os distritos autônomos de Yamalo-Nenets e Khanty-Mansi assinaram um tratado.